“A Boa Mentira (The Good Lie)” de Philippe Falardeau
Por alguns momentos cheguei a confundir este The Good Lie com Wild, o filme que promete trazer Reese Witherspoon de volta para as luzes da ribalta.
Ambos realizados por canadianos (Philippe Falardeau e Jean-Marc Vallée), com Reese como protagonista e rodados em ambientes áridos e selvagens, os dois pareceram-me um só. Puro engano.
E a primeira diferença está precisamente em Witherspoon.
É a atriz de New Orleans quem “dá a cara” por este The Good Lie mas a sua participação acaba por ser bastante secundária. Para total surpresa.
O protagonismo é, sim, partilhado por um grupo de miúdos e outro de graúdos, oriundos do coração de África. O ambiente é selvagem, disso não restam dúvidas, mas a História é demasiado real.
The Good Lie conta a história verídica de um grupo de miúdos, alguns entre milhares, que viveram um trauma incomensurável. Muito se fala, muito se escreve, sobre o assunto mas ver, mesmo que no cinema, é uma forma bem mais dolorosa de sentir a realidade.
Sudão, meados dos anos 80. A Guerra Civil implode naquele pobre país africano resultando na chacina de algumas das etnias e na fuga dos que puderem. Milhares de crianças procuram refúgio no Quénia mas para lá chegar terão de caminhar centenas de quilómetros sem segurança alguma, comendo o que encontram, nada bebendo durante dias. De entre elas acompanhamos a indescritível viagem de Mamere, Theo, Jeremiah, Paul, Abital e Gabriel.
Décadas mais tarde são acolhidos nos EUA por uma ONG que procura revitalizar a vida dessas crianças, agora adultos. Porém, alguns traumas são pesados demais para se ultrapassar.
A primeira meia hora é realmente impensável. É duro, mesmo no cinema, constatar a crueldade dos homens, o espírito de sacrifício dos mais desfavorecidos, a união daqueles que tudo superaram. O realismo é gritante, chega a ser, inclusive, revoltante (vi)ver alguns dos incidentes. Mas se a dor é angustiante, a esperança é recompensadora. E só isso já justifica(va) a segunda metade do filme.
Ainda assim, cinematograficamente falando, fica a ideia que faltou engenho e arte para balancear a emoção do filme. É verdade que a primeira parte da História é incomparável com tudo o que se segue mas a décalage é demasiado profunda para passar incólume. Acredito, piamente, que outras forma haveriam para contar a mesma história,
Pois, nem sempre um grande enredo é suficiente para fazer um grande filme. É necessário saber o que fazer com ele… e nem sempre a solução mais linear é a melhor.
Um filme tocante que, no mínimo, funcionará como uma verdadeira lição de vida para todos nós!
Por mais doloroso que seja.