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“Variações” de João Maia

Há algo inato à Arte portuguesa que é também evidente na 7ª e, naturalmente, neste Variações.

Curiosamente, a preocupação em agradar a si mesmo em primeiro e só depois ao público – essa noção de não ser popular por não querer ser populacho – faz com que muitas vezes no cinema, na música, nas artes plásticas e em tantas outras áreas, o “artista” português prive-se de agradar aos seus, em favor da “sua arte”.

Isto a propósito de Variações, António. O artista natural de Amares, criou o seu espaço, o seu legado, olhando sempre primeiro para o seu umbigo e só (muito) depois para os outros. A sua originalidade e loucura só foi possível dessa forma. E ainda bem.

O senão é quanto olhamos para exemplos como Variações, o filme. Se recuperarmos os mais recentes biopics musicais, de Freddie Mercury a Elton John, passando pelo mais recente Blinded by the Light em torno do The Boss, Bruce Springsteen, o seu sucesso é fruto do mediatismo dessas figuras incontornáveis da cultura pop dos nossos dias e, evidentemente, do uso intensivo dos seus maiores sucessos.

Porém, a opção de João Maia – ao bom estilo nacional – foi vender a sua arte e o seu Variações, o Sérgio Praia, por ele próprio e não recorrendo aos seus maiores hits, como É p’ra Amanhã ou O Corpo É que Paga. Louva-se o esforço e dedicação e, até, o resultado final, mas quão melhor – em termos de impacto e proliferação – teria sido o filme se todos nós reconhecemos as canções, se todos trauteássemos as suas músicas, se todos fossemos, um pouco, Variações?

O invés, o filme aposta em sons mais alternativas, mas pessoais, como se o sucesso e virtuosismo de Variações não tivesse passado (também) por ter tornado essas mesmas sonoridades, parte do nosso dia-a-dia.

Com isso, enfatizado ainda mais pelas opções narrativas no último terço do filme – mas isso abordaremos já de seguida – o grande beneficiado acaba por ser Sérgio Praia. Sem o dispersar de atenção, o ator de Ovar tem o caminho aberto para construir o seu António, o seu artista, ele mesmo. E é, realmente, tremendo. Ao nível do que de melhor se faz por esse mundo fora. Visualmente, sonoramente e, sobretudo, com uma aura que recupera para os dias de hoje um artista de marcou uma era, e que, infelizmente, partiu cedo demais! É por ele, que vale este Variações. O papel de uma vida. Seguramente.

O senão, foi que na ânsia de agradar à sua arte e ao seu artista, tanto a António como a Sérgio, Variações perde-se no último terço da sua narrativa, preferindo realçar o protagonista – dando-lhe tempo de antena, visuais, diálogos e momentos a solo – ao invés de contar a História.
Ficamos – nós que conhecemos Variações, o música, apenas do que se conta dele pelas ruas – sem perceber ao certo de onde veio o seu sucesso e fama, até que ponto chegou a sua notoriedade, se beneficiou, em vida, ou teve noção do seu talento, do seu impacto no mundo musical e na sociedade portuguesa.

O cinema português evoluiu consideravelmente, pelo menos este Variações fê-lo, mas continua refém desse Fado, dessa triste maneira de ser, dessa soturnidade e medo em ser feliz, retumbante e popular!

Bohemian Rhapsody termina com um concerto num Estádio com mais de 80.000 pessoas.
Variações termina num quarto de hospital. Just saying…

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