“Elementos Secretos (Hidden Figures)” de Theodore Melfi
Continuamos na senda dos Oscars®, desta vez com o filme mais “normal” de entre os nomeados (ao prémio de Melhor Filme).
Uma história simples, direta, com princípio, meio e fim, e, para mais, baseada em factos verídicos! É possível pedir mais?
Sim, é!
Um filme que fala de racismo, machismo, xenofobia, ciência, descoberta e emancipação. Um filme que derruba preconceitos, dogmas e revela uma história tão incrível como a chegada do homem à Lua… ou a primeira viagem espacial, de um norte-americano.
Como já devem ter percebido por agora, Hidden Figures não é propriamente um filme sobre os feitos da NASA e de John Glenn (o primeiro astronauta norte-americano no espaço) mas, sim, sobre os muitos que, de forma anónima, contribuíram para que isso fosse possível.
3 Mulheres negras, cada uma à sua maneira, tiveram contributos inestimáveis não apenas para a ciência, mas para a evolução do Homem, e especialmente das mulheres de raça negra. Numa sociedade altamente preconceituosa, mesmo nos mais altos patamares de conhecimento e descoberta, continuavam a persistir comportamentos impensáveis e profundamente lamentáveis.
Katherine G. Johnson (Taraji P. Henson) tinha uma das mentes mais brilhantes da sua era, completando cálculos extraordinários em poucos segundos.
Dorothy Vaughan (Octavia Spencer) foi das primeiras a perceber a importância em saber programar os altamente sofisticados e complexos computadores da IBM.
Mary Jackson (Janelle Monáe) era uma perspicaz engenheira ao serviço da NASA mas sem possibilidade de assumir a profissão e o cargo, por via dos constantes entraves à sua progressão interna.
Estas 3 mulheres personificam muitas outras que na NASA ou em qualquer outra profissão, tiveram de enfrentar uma sociedade formalmente aberta mas com mentes ainda enclausuradas em décadas de preconceito, medo e simples ignorância.
Como pano de fundo temos a vertiginosa corrida entre os EUA e a União Soviética pelo controlo do espaço. Em plena Guerra Fria, os dois blocos encetaram uma saudável competição pela última fronteira por explorar, o espaço. Levar o Homem à Lua era o objetivo final mas antes era necessário encetar uma série de pequenos passos.
Na NASA, as mentas mais brilhantes (do mundo ocidental) conjugavam-se para levar a empreitada a bom porto, sem olhar as raças, géneros ou estatutos. Mas, se no papel assim era, na prática, havia ainda muitas barreiras por derrubar.
É uma história incrível, não só de persistência mas, sobretudo, de profunda ignorância. Aos nossos olhos – e mesmo que o preconceito e o racismo não estejam, de forma alguma, extintos – muito de retratado é, no mínimo, impensável. Tão incrível como esta história ter demorado mais de 50 anos a chegar ao cinema…
Uma grande história, bons desempenhos e a humildade de se cingir apenas ao essencial, a História, ao invés de se perder entre truques e experimentalismos artísticos, fazem de Hidden Figures um dos mais completos e agradáveis filmes desta temporada dos Oscars®. Um filme que utiliza uma linguagem reconfortante e acessível ao grande público e que comove e surpreende, na mesma medida.
Cinema de qualidade, para todos os gostos e credos.
Cinema social que demonstra que muito do que consideramos como adquirido, está ao alcance de um lunático.
Cinema divertido porque até os assuntos mais sérios podem (e devem) ser encarados com um sorriso nos lábios… e um arrepio na espinha.
Well Done!
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